A Agência Nacional de Vigilância Sanitária (“ANVISA”) abriu a Consulta Pública nº 1297/2024, com o objetivo de colher contribuições para regulamentar o processo administrativo sanitário (“PAS”), estabelecendo diretrizes sobre a fiscalização responsiva e as etapas a serem seguidas nos processos sancionatórios relacionados à área da saúde pública.
A proposta busca definir claramente o procedimento a ser adotado pela ANVISA em situações que envolvem infrações sanitárias, abrangendo desde a aplicação de medidas preventivas até a imposição de penalidades.
Atualmente, não existe uma norma específica que trate exclusivamente do PAS. As regras referentes a esses processos estão dispersas em diversas legislações, como as Leis nº 6.437/1977, que trata das infrações sanitárias, e nº 9.784/1999, que regula a organização dos procedimentos administrativos no âmbito da Administração Pública Federal.
Além dessas, outras normas complementam o sistema legal, como a Lei nº 9.294/1996, que regula as restrições ao uso e à propaganda de produtos como fumos, bebidas alcoólicas, medicamentos e defensivos agrícolas, e a Lei nº 9.873/1999, que estabelece o prazo de prescrição para ações punitivas pela Administração Pública.
A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 266/2019 também contribui, especificando os procedimentos relativos à interposição de recursos administrativos nas decisões da ANVISA.
A iniciativa para regulamentar o PAS surgiu após auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (“TCU”), que resultou no Acórdão nº 732/2020 – Plenário. Duante o procedimento, foram identificados diversos processos arquivados por prescrição diante da ausência de julgamento junto à ANVISA, além disso, foi identificado o não acolhimento dos prazos processuais para realização dos julgamentos pela Agência.
Este acórdão recomendou que fosse estabelecido um marco normativo mais claro e específico para o processo administrativo sanitário, com o objetivo de proporcionar mais transparência e eficiência à fiscalização sanitária, emitindo as seguintes considerações:
A minuta da resolução proposta pela ANVISA classifica as medidas administrativas em três tipos: prévia, acautelatória e sancionatória. A medida administrativa prévia é uma novidade introduzida pela ANVISA e poderá ser aplicada pela autoridade sanitária quando os danos causados pela infração forem de baixo ou médio impacto para a saúde pública.
Essa medida visa permitir que o infrator corrija rapidamente a infração sem que haja penalização imediata, estimulando a conformidade com a legislação sem a necessidade de autuações formais. Trata-se de uma estratégia positiva, pois oferece ao infrator a oportunidade de se adequar sem a imposição de sanções, o que, até então, não era previsto.
As medidas acautelatórias incluem ações cautelares ou preventivas e podem ser aplicadas a qualquer momento, caso haja risco iminente à saúde pública. Essas medidas podem ser adotadas sem a manifestação prévia do infrator, sendo uma forma de intervenção imediata para evitar danos maiores, podendo coexistir com outras medidas, como as prévias ou sancionatórias. Essas medidas já estão previstas na Lei nº 6.437/1977 e não representam uma inovação.
No entanto, a ANVISA esclarece que os recursos interpostos contra a medidas acautelatórias não terão efeito suspensivo, ou seja, a medida será executada mesmo que haja contestação. No entanto, a ausência de efeito suspensivo pode gerar danos irreparáveis, como a retirada e destruição de produtos do mercado. Nesse contexto, a minuta deveria propor que o recurso tenha efeito suspensivo quando comprovado que a medida causará um dano irreparável, o que estaria alinhado com o disposto no artigo 61, §2º, da Lei nº 9.784/1999.
A proposta também detalha as etapas do processo administrativo sancionatório, que incluem:
A minuta da resolução ainda aborda as diferentes espécies de penalidades e os critérios para sua aplicação, como a reincidência do infrator, atenuantes, agravantes e a dosimetria da pena, especialmente no que diz respeito ao valor das multas.
Além disso, a proposta inclui a regulamentação do Termo de Compromisso de Ajustamento de Conduta (“TCAC”), uma medida introduzida pela Lei nº 14.671/2023 à Lei nº 6.437/1977. Essa lei autorizou os órgãos do Sistema Nacional de Vigilância Sanitária (SNVS) a firmarem termos de compromisso com os infratores, visando corrigir as infrações e evitar a imposição de penalidades imediatas.
A minuta da ANVISA prevê que, caso o infrator descumpra o TCAC, ele poderá ser penalizado com a execução integral do valor acordado, além da proibição de negociar novos compromissos por um período de cinco anos. Essa regra, do nosso ponto de vista, vai além do que está previsto na Lei nº 6.437/1977, especificamente no artigo 28-A, que suspende a aplicação de sanções administrativas enquanto o termo de compromisso estiver em vigor, exceto as de caráter preventivo e cautelar.
Portanto, em vez de realizar a cobrança diretamente ao infrator ao constatar o descumprimento, a ANVISA deveria notificá-lo, rescindir o TCAC e, em seguida, aplicar as medidas sancionatórias cabíveis.
A Consulta Pública nº 1297/2024 estará aberta até o dia 03 de fevereiro de 2025, e é essencial a participação da sociedade, principalmente para discutir os pontos críticos como os efeitos das medidas acautelatórias e os critérios adotados para o TCAC.
Para mais informações sobre o tema, a equipe de Life Sciences & Healtcare está a disposição.
A participação no processo de consulta pública é uma oportunidade importante para cidadãos, organizações e profissionais da área de saúde influírem diretamente na formulação das políticas públicas relacionadas à vigilância sanitária no Brasil.
A íntegra da Consulta Pública pode ser acessada aqui.
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