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Orientações sobre Medida Provisória nº 927 DE 22/03/2020

No final da noite de ontem, dia 22/03/2020, em edição extra do Diário Oficial da União, foi publicada a Medida Provisória n.º 927, que dispõe sobre as medidas trabalhistas para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19). Há notícias de que o Governo Federal publicará uma segunda Medida Provisória, esta sim, possibilitando redução de jornada e respectiva redução salarial, como inclusive foi noticiado pela impressa na semana passada, o que estava sendo esperado por grande parte dos empresários, a fim de se evitar desligamentos em massa. Todavia, importante destacar que, uma vez que a Medida Provisória n.º 927 nada dispõe sobre o assunto, nenhum empregador poderá reduzir jornada e salário de seus empregados, sem prévia negociação coletiva diretamente com o sindicato da categoria, haja vista o princípio constitucional da “irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo”, previsto no artigo 7º, VI da Constituição Federal. Caso medidas como estas sejam adotadas individualmente pelas empresas com cada um de seus empregados, tal ato deve ser considerado nulo, com risco de posterior reconhecimento de diferenças salariais devidas. Desta feita, passemos a discorrer exclusivamente sobre os assuntos tratados na Medida Provisória n.º 927:

 

VIGÊNCIA

A MP 927 passou a vigorar na data de sua publicação, ou seja, a partir de 22/03/2020, mas torna válidos os atos praticados pelos empregadores que tenham ocorrido no período de 30 dias antes e que não contrariem o disposto na referida MP. Importante esclarecer que a Medida Provisória (MP) é um instrumento com força de lei, adotado pelo presidente da República, em casos de relevância e urgência, que produz efeitos imediatos, mas depende de aprovação do Congresso Nacional para transformação definitiva em lei. Seu prazo de vigência é de 60 (sessenta) dias, prorrogáveis uma vez por igual período e, se não for aprovada no prazo de 45 dias, contados da sua publicação, a MP tranca a pauta de votações da Casa em que se encontrar (Câmara ou Senado) até que seja votada. Neste caso, a Câmara só pode votar alguns tipos de proposição em sessão extraordinária. Ao chegar ao Congresso Nacional, é criada uma comissão mista, formada por deputados e senadores, para aprovar um parecer sobre a Medida Provisória. Depois, o texto segue para o Plenário da Câmara e, em seguida, para o Plenário do Senado. Se a Câmara ou o Senado rejeitar a MP ou se ela perder a eficácia, os parlamentares têm que editar um decreto legislativo para disciplinar os efeitos jurídicos gerados durante sua vigência. Se o conteúdo de uma Medida Provisória for alterado, ela passa a tramitar como projeto de lei de conversão. Depois de aprovada na Câmara e no Senado, a Medida Provisória – ou o projeto de lei de conversão – é enviada à Presidência da República para sanção. O Presidente tem a prerrogativa de vetar o texto parcial ou integralmente, caso discorde de eventuais alterações feitas no Congresso. Além disso, e vedada a reedição, na mesma sessão legislativa, de MP que tenha sido rejeitada ou que tenha perdido sua eficácia por decurso de prazo.

 

APLICABILIDADE

A MP 927 aplica-se aos empregados urbanos, rurais, domésticos e temporários, mas não se aplicam a estes, quando atuarem em teletrabalho, as regras específicas sobre teleatendimento e telemarketing (art. 32 e 33).

 

ACORDO INDIVIDUAL ESCRITO

O artigo 1º da MP 927 autoriza que, durante o estado de calamidade pública decretado pelo governo federal, em decorrência do enfrentamento do coronavirus (COVID-19) “o empregado e o empregador poderão celebrar acordo individual escrito, a fim de garantir a permanência do vínculo empregatício, que terá preponderância sobre os demais instrumentos normativos, legais e negociais, respeitados os limites estabelecidos na Constituição”.

 

MEDIDAS EMPRESARIAIS POSSÍVEIS

O artigo 3º da MP 927 dispõe sobre as medidas empresariais possíveis, a fim de enfrentar os efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade pública e para preservar o emprego e a renda dos empregados, sendo elas: (I) o teletrabalho; (II) a antecipação de férias individuais; (III) a concessão de férias coletivas; (IV) o aproveitamento e a antecipação de feriados; (V) o banco de horas; (VI) a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; (VII) o direcionamento do trabalhador para qualificação; e (VIII) o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS. Passemos a discorrer sobre cada uma delas, conforme a seguir:

 

I – TELETRABALHO, TRABALHO REMOTO OU TRABALHO À DISTÂNCIA

A MP 927 define teletrabalho como “trabalho remoto ou trabalho a distância a prestação de serviços preponderante ou totalmente fora das dependências do empregador, com a utilização de tecnologias da informação e comunicação que, por sua natureza, não configurem trabalho externo, aplicável o disposto no inciso III do caput do art. 62 da Consolidação das Leis do Trabalho, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1943”, nada muito diferente daquilo previsto na CLT. Com relação ao “trabalho remoto” ou o “trabalho à distância”, não há definição expressa na MP, sendo todos tratados como sinônimos de teletrabalho, estando todos autorizados, inclusive para estagiários e aprendizes. Todavia, a MP autoriza que, durante o estado de calamidade pública, a empresa adote o regime de trabalho de forma remota, independentemente de aceite do empregado, como decisão unilateral do empregador, dispensando a necessidade de formalização por aditivo contratual, exigindo apenas notificação por escrito ou por meio eletrônico ao empregado, no prazo de 48h, antes da alteração do regime. De qualquer forma, recomendamos que seja adotado um termo de ciência de trabalho remoto, com diretrizes sobre horários de trabalho e forma de controle dele, suspensão da concessão de benefícios como o vale transporte e eventuais custos despendidos pelo empregado com energia e equipamentos, podendo ser fixado uma ajuda de custo, se assim for acordado entre as partes.

 

II – ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS INDIVIDUAIS 

A MP 927 autoriza que o empregador conceda férias individuais aos empregados (com prioridade àqueles que pertencem ao grupo de risco para o COVID-19), desde que observe período mínimo de 5 dias de férias e ainda que o empregado não tenha completado o período aquisitivo, podendo haver negociação por escrito entre empregado e empregador, a antecipação de períodos futuros de férias. O empregador deverá observar antecedência prévia de 48h para comunicação das férias, realizando tal comunicação por meio escrito ou eletrônico. O pagamento das férias não precisa ser feito de forma antecipada e pode ser pago até o 5º dia útil do mês subsequente ao gozado. O terço constitucional das férias poderá ser pago logo após a concessão das férias ou até o dia 20/12, com o pagamento do 13º salário, a critério do empregador. Durante período de calamidade, podem ser suspendidas as férias dos profissionais da saúde e de profissionais de serviços essenciais, mediante comunicação escrita ou por meios eletrônicos, preferencialmente, com 48h de antecedência.

 

III – CONCESSÃO DE FÉRIAS COLETIVAS

A MP 927 possibilitou a concessão de férias coletivas, mediante prévio aviso de 48h (não especificando se de forma escrita ou eletrônica, mas recomendado que se faça de uma das formas), sem observância do período de pré-aviso de 15 dias e dispensou a necessidade de comunicação ao Ministério da Economia e ao Sindicato da Categoria. A referida MP também possibilitou o gozo de mais de 2 períodos de férias coletivas no ano e que tais períodos, durante o período de calamidade, tenham menos de 10 dias.

 

IV – APROVEITAMENTO E A ANTECIPAÇÃO DE FERIADOS

A MP 927 autoriza que os empregadores antecipem e compensem, inclusive em banco de horas, os feriados não religiosos federais, estaduais, distritais e municipais. Para tanto, o empregador deverá, com 48h de antecedência, notificar, por escrito ou por meio eletrônico, o conjunto de empregados beneficiados, mediante indicação expressa dos feriados aproveitados. Quanto aos feriados religiosos podem ser antecipados e compensados apenas se houve concordância escrita do empregado, em acordo individual.

 

V – BANCO DE HORAS

A MP 927 autorizou a instituição de banco de horas, através de acordo coletivo ou de acordo individual, para a compensação no prazo de até 18 meses, contados da data de encerramento do estado de calamidade pública. Para compensação, deverá se observado o máximo de 2 horas extra diárias e o limite de 10 horas laboradas por dia.

 

VI – SUSPENSÃO DE EXIGÊNCIAS ADMINISTRATIVAS EM SEGURANÇA E SAÚDE NO TRABALHO

a) Exames médicos: Os exames médicos ocupacionais, clínicos e complementares (a exceção do exame médico demissional e se o médico do trabalho entender necessários), não precisarão ser realizados, durante o período de calamidade pública, devendo ser realizados no prazo de 60 dias após o encerramento da calamidade pública. No caso do exame médico demissional, fica dispensada sua realização, se realizado outro exame ocupacional há menos de 180 dias.

b) Treinamentos: A MP 927 suspende a obrigatoriedade de realização de treinamentos periódicos e eventuais dos atuais empregados, previstos em normas regulamentadoras de segurança e saúde no trabalho, durante o período de calamidade pública, devendo ser realizados no prazo de 90 dias após encerramento da calamidade pública. Alternativamente, fica autorizado que tais treinamentos sejam realizados através de ensino à distância.

c) CIPA: Os processos eleitorais para membros da CIPA em curso podem ser suspensos até o encerramento do período de calamidade, sendo que, até lá, fica mantida a comissão atual.

 

VII – DIRECIONAMENTO DO TRABALHADOR PARA QUALIFICAÇÃO

A MP 927 autoriza a suspensão do contrato de trabalho, durante o estado de calamidade pública, pelo prazo de até 4 meses, para qualificação profissional do empregado, através de curso ou programa à distância, oferecido diretamente pelo empregador ou por entidades responsáveis pela qualificação, podendo haver pagamento de uma ajuda compensatória mensal, sem natureza salarial, conforme valor livremente pactuado entre empregado e empregador, de forma individual, sem necessidade de negociação coletiva. Todavia, na tarde desta segunda-feira, após diversas repercussões negativas na sociedade e no meio jurídico, inclusive com manifestação formal da ANAMATRA, o Presidente da República, por meio de suas redes sociais, publicou mensagem informando que determinou a revogação do artigo 18 que dispõe sobre essa medida. Portanto, apesar de inexistir publicação oficial a respeito, diante de tal informação, não recomendamos que a medida seja adotada.

 

VIII – DIFERIMENTO DO RECOLHIMENTO DO FUNDO DE GARANTIA DO TEMPO DE SERVIÇO – FGTS

A MP 927 autorizou que o recolhimento do FGTS das competências de março, abril e maio de 2020 poderá ser realizado de forma parcelada, sem a incidência da atualização, da multa e dos encargos, em até 6 parcelas, a partir de julho/2020. Para tal prerrogativa, o empregador fica obrigado a declarar as informações, até 20 de junho de 2020. Na hipótese de rescisão contratual do empregado antes desta data, os valores devem ser pagos juntamente com o recolhimento fundiário rescisório.

 

OUTRAS MEDIDAS EMPRESARIAIS POSSÍVEIS

I – prorrogação de jornada de trabalho, por acordo individual escrito, inclusive para atividades insalubres e para jornada 12×36 e em desrespeito ao intervalo interjornadas de 11 horas entre o término de uma jornada e início de outra, respeitando-se apenas o descanso semanal remunerado (art. 26).

II – compensação de horas, por banco de horas ou pagamento de horas extras, no prazo de 18 meses depois de findado o estado de calamidade pública (art. 27)

III – suspensão de prazos de 180 dias, contados de 22/02/2020, para apresentação de defesas e recursos em autos de infração trabalhistas e notificações de débito de FGTS (art. 28);

IV – não serão considerados doença ocupacional os casos de contaminação pelo coronavírus (COVID-19), exceto mediante comprovação do nexo causal (art. 29);

V – acordos ou convenções coletivas que tiverem vencimentos no prazo de 180 dias, contados de 22/02/2020, poderão ser prorrogados por mais 90 dias, a critério do empregador (art. 30);

VI – suspensão de 180 dias, contados de 22/02/2020, para fiscalização de auditores fiscais do trabalho, que deverão atuar de maneira apenas orientativa, exceto nos casos de (a) falta de registro de empregado, a partir de denúncias; (b) situações de grave e iminente risco, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas à configuração da situação; (c) ocorrência de acidente de trabalho fatal apurado por meio de procedimento fiscal de análise de acidente, somente para as irregularidades imediatamente relacionadas às causas do acidente; e (d) trabalho em condições análogas às de escravo ou trabalho infantil (art. 31).

 

ABONO ANUAL DOS AFASTADOS

A MP 927 garante ao beneficiário da Previdência Social que, durante o ano de 2020, tenha recebido auxílio-doença, auxílio-acidente ou aposentadoria, pensão por morte ou auxílio-reclusão será efetuado em duas parcelas, excepcionalmente, da seguinte forma: (a) a primeira parcela corresponderá a cinquenta por cento do valor do benefício devido no mês de abril e será paga juntamente com os benefícios dessa competência; e (b) a segunda parcela corresponderá à diferença entre o valor total do abono anual e o valor da parcela antecipada e será paga juntamente com os benefício da competência do mês de maio.